Nas redes sociais, imagens de vídeos e fotos mostram o desespero e o terror das moradoras e dos moradores do Complexo do Alemão, na zona norte do Rio de Janeiro (RJ), que, desde quinta-feira (21), foi local de mais uma operação conjunta das polícias Militar e Civil fluminenses. Aos gritos e choros, pessoas corriam carregando feridos, na tentativa de socorrer as vítimas.
“O beco aqui na frente de casa está cheio de sangue e os moradores gritando que tem gente baleada”, relatou um morador que, desde 5h30 da quinta-feira, enfrentava um cenário de guerra na porta de sua própria residência, segundo o site Voz das Comunidades, que traz notícias sobre as favelas do RJ.
Em vídeos, moradores e moradoras registraram policiais arrombando portas para invadir as casas e as moradias reviradas após a saída dos agentes. Pelas redes socais, denunciavam também que diversas pessoas idosas passaram mal, assustadas com a brutalidade da ação.
Escolas, postos de saúde e comércios ficaram fechados e trabalhadores e trabalhadoras não conseguiram de deslocar por conta dos tiroteios, situação que já se tornou “comum” com as operações policiais na cidade carioca.
“A chacina no Complexo do Alemão é um reflexo da postura genocida adotada pela segurança pública do Estado do Rio de Janeiro no último ano. Nesse período de tempo, os agentes policiais sob o comando do governador Cláudio Castro efetuaram a chacina do Jacarezinho (06 de maio de 2021, com 28 mortes) e do Complexo da Penha (24 de maio de 2022, com 25 mortos). De acordo com a matéria do Nexo Jornal, que utiliza dados da plataforma Fogo Cruzado, com a ação de hoje, a gestão do atual governador possui as três maiores chacinas policiais na história do Rio de Janeiro”, afirma notícia do Voz das Comunidades.
4ª maior chacina da história
Oficialmente, a PM informou que já são 19 mortos, sendo que uma moradora foi atingida por tiros na manhã desta sexta-feira (22). Há relatos, como sempre, de que o número de vítimas é maior.
A operação durou cerca de 12 horas e é a terceira chacina realizada em pouco mais de um ano no governo de Cláudio Castro (PL), figurando entre as cinco maiores chacinas já realizadas pela polícia na história do Rio de Janeiro.
Anteriormente, ocorreu a chacina no Jacarezinho, em maio de 2021, quando 28 pessoas morreram; a operação na Vila Cruzeiro, em maio deste ano, que deixou 25 mortos; e, em 2007, também no Complexo do Alemão, com 19 mortos.
Dos 19 mortos, até a manhã desta sexta-feira, a polícia informou que oito tinham algum tipo de antecedente criminal. Na ação de quinta-feira, morreram um policial e outra mulher que passava de carro e foi alvejada por tiros da polícia, segundo testemunhas.
Em nota, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro afirmou haver "indícios de situações de grave violação de direitos" durante a operação no Complexo do Alemão, "com possibilidade desta ser uma das operações com maior índice de mortos no Rio de Janeiro".
A Anistia Internacional Brasil também se manifestou nas redes. “O Ministério Público tem o dever constitucional de fazer o controle externo da polícia. É inaceitável que ações mal planejadas que violam os direitos humanos de tantas pessoas continuem ocorrendo no RJ sem que nada seja feito pelos órgãos de competência”.
Política desastrosa e falida
O governador Cláudio Castro e as polícias alegam que tais operações se tratam de “combate à violência”, “que os mortos são criminosos”, o que obviamente não é justificativa para chacinas e execuções, além de relatos de testemunhas revelarem casos de pessoas que não ofereceram qualquer resistência e foram executadas.
De acordo com uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que durante a pandemia, somente operações policiais excepcionais poderiam ser realizadas nas favelas, o que não foi é respeitado pelas forças policiais sob comando do governo do estado.
Segundo o Monitor da Violência, uma parceria do G1 com o Núcleo de Estudos da Violência da USP e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o número de pessoas mortas por policiais no estado do RJ aumentou 8,9% em 2021 na comparação com 2020. Foram 1.356 mortes no ano passado - o maior número em todo o Brasil.
Em nota, a Federação de Associações das Favelas do Rio de Janeiro (Faferj) se pronunciou sobre a operação.
“Mais uma manhã de terror. Cláudio Castro, o governador das chacinas, autorizou mais uma operação eleitoreira em favela. Na guerra da Ucrânia e em vários outros conflitos é proibido utilizar helicóptero como plataforma de tiro em área civil, é crime internacional. Mas nas favelas isso acontece cotidianamente, inclusive hoje no Alemão, com o Águia (helicóptero blindado) aterrorizando moradores. Essa lógica de guerra é um enxuga gelo que não resolve o problema da violência, ao contrário, apenas piora. Nós, da FAFERJ, repudiamos essa operação eleitoreira autorizada pelo governador das chacinas, Cláudio Castro. Também externamos nossa solidariedade aos moradores do Complexo do Alemão. As favelas pedem paz e também direitos iguais!”
A CSP-Conlutas, central à qual o ANDES-SN é filiado, defende a apuração imediata dos crimes e a reparação do Estado às famílias de vítimas da violência policial. Da mesma forma é necessário dar um basta no modelo de segurança pública que penaliza trabalhadores e trabalhadoras, em sua maioria negras, negros e pobres, em nome de uma falsa guerra às drogas em que a grande derrotada é a população.
* Fonte: CSP-Conlutas, com edição do ANDES-SN. Com informações de Voz das Comunidades. Foto Capa: Sema Souza/Voz das Comunidades
Leia também:
Ação policial deixa pelo menos 25 mortos e leva pânico à comunidade no Rio de Janeiro
Chacina: Operação policial deixa 25 mortos na comunidade de Jacarezinho no Rio
STF suspende operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia