Nota da diretoria do ANDES-SN sobre as manifestações de “comemoração” do golpe empresarial-militar de 31 de março de 1964
“Não é lícito esquecer, não é lícito calar. Se calarmos, quem falará? Claro que não os culpados e seus cúmplices. Se faltar nosso testemunho, num futuro nada distante os feitos da bestialidade nazista, exatamente por sua enormidade, poderão ser relegados ao rol das lendas. Falar, portanto, é preciso.” Primo Levi, Deportados. Aniversário. A assimetria e a vida.
A diretoria do ANDES-SN vêm a público somar-se às manifestações de repúdio à recomendação da Presidência da República ao Ministério da Defesa para que sejam feitas “comemorações devidas” no dia 31 de março de 2019, quando se completam 55 anos do golpe empresarial-militar de 1964.
Após oito anos, o golpe empresarial-militar que depôs o presidente Jango, cassou direitos políticos, praticou a tortura sistemática contra opositores, exterminou 8 mil indígenas, assassinou e mantém “desaparecido(a)s" 434 militantes e opositores do regime, puniu 4.841 cidadã(o)s com perdas de direitos políticos, cassação de mandato, aposentadoria e demissão, entre estes 3873 funcionário(a)s público(a)s, sendo 72 professore(a)s e 61 pesquisadore(a)s, o golpe empresarial-militar volta a ser oficialmente incluído na agenda oficial do governo federal.
A sociedade civil brasileira não pode tolerar e aceitar que os retrocessos políticos com a ascensão ao poder da ultradireita recuem ao período em que as liberdades democráticas foram interrompidas.
Os resultados finais da Comissão Nacional da Verdade, em que o Estado brasileiro reconheceu oficialmente os crimes cometidos por agentes e funcionários dos governos em nome da Doutrina de Segurança Nacional e da política de “guerra ao inimigo interno” não podem ser rasgados com uma simples recomendação de quem ocupa o principal cargo de representação política do país.
O ANDES-SN somou-se às várias iniciativas da sociedade civil, familiares de preso(a)s e perseguido(a)s político(a)s, instituições, parlamentos, partidos políticos, igrejas, e também constituiu uma Comissão da Verdade para trazer à tona os crimes cometidos pelo Estado brasileiro contra professore(a)s, estudantes, servidore(a)s técnico(a)-administrativo(a)s das Instituições de Ensino Superior.
Entendemos que é preciso continuar a busca por informações sobre os assassinatos de militantes que se tornaram, na linguagem do poder ditatorial, “desaparecido(a)s político(a)s”, pois foram preso(a)s por agentes do Estado vivo(a)s e o(a)s familiares até hoje continuam a busca de informações sobre as formas pelas quais se deram o seu assassinato e desaparecimento.
Para a diretoria do ANDES-SN é preciso que o Estado brasileiro, na forma de suas instituições, façam valer os resultados da Comissão Nacional da Verdade, entregues em relatório final em 10 de dezembro de 2014, com 29 recomendações à União para o aprofundamento do Estado democrático de direito, reparando-se as graves violações aos direitos humanos e construindo uma cultura de paz e justiça.
Somente com memória, verdade, justiça e reparação a sociedade brasileira estará alerta para o perigo do retorno de quebra das instituições democráticas. Manifestações que buscam revisar o passado recente para apagar das memórias as lutas que o povo brasileiro engendrou contra a ditadura empresarial-militar devem ser repudiadas por toda a sociedade.
Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça.
Por memória, verdade, justiça e reparação.
Brasília(DF), 27 de março de 2019.
Diretoria do ANDES-Sindicato Nacional