Um estudante de Direito da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul, foi vítima de LGBTTIfobia durante apresentação do seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), no dia 15 de julho. O tema abordado por Pablo Domingues foi discursos de ódio LGBTTIfóbicos e criminalização da homotransfobia por ações julgados pelo Supremo Tribunal Federal.
Uma sala virtual foi montada para a defesa do trabalho e cerca de 75 pessoas -dentre familiares e amigos - acompanhavam a apresentação quando Pablo foi interrompido por um grupo anônimo que estava na sala. Gemidos pornográficos e, logo depois, sopros no microfone foram alguns dos atos feitos para atrapalhar a banca. Em seguida, duas pessoas desconhecidas ligaram as câmeras. Por fim, reproduziram áudios do presidente Jair Bolsonaro em entrevistas concedidas quando ainda era deputado federal. “O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um coro, ele muda o comportamento dele”, dizia o então parlamentar em um dos áudios.
Estudante e professores desligaram-se da sala inicial após os ataques e uma nova sala privada foi criada. Contudo, a primeira sala continuou sendo gravada por mais trinta minutos posteriormente à saída de Pablo Domingues, permitindo o registro de mais declarações LGBTTIfóbicas: “acabamos com esse seminário gay” e “morte aos gays”.
Investigação
Após os ataques, uma das orientadoras da banca, Rosane Leal da Silva, informou aos órgãos competentes da UFSM e Ministério Público Federal, o qual solicitou que fosse aberta investigação. A UFSM também está apurando internamente. Pablo Domingues registrou um boletim de ocorrência na Polícia Federal e um inquérito foi instaurado para apurar os fatos.
Em nota, a UFSM afirmou que "repudia toda e qualquer conduta desrespeitosa, intolerante, discriminatória em qualquer ambiente e circunstância", e que está orientando as unidades de ensino de como proceder com segurança nos ambientes digitais, “visando coibir a prática de condutas como as recentemente vivenciadas durante webconferências e aulas práticas”.
Para Pablo Domingues, o pior já passou e, apesar de grave o ocorrido, felizmente não atingiu a sua integridade física e conseguiu ter uma assistência perante o caso. “Eu tive o direito de ser vítima, eu tive o direito de ser ouvido e relatar a agressão que eu sofri, mas muitos outros e outras não conseguem ter sua voz e dores ouvidas, não são tratados com humanidade, assim como eu fui”, observou.
“Sabemos que essa não é a realidade de muitos LGBTTI, muitos são assassinados diariamente, expulsos de casa, precisam se prostituir para ter o que comer. Então eu faço um apelo para que a gente discuta a LGBTTIfobia para além de quando ocorre um episódio de violência, que a gente discuta sexualidade e gênero nas escolas, na faculdade, nos trabalhos, em todos ambientes. Que a gente discuta políticas públicas e não somente criminalização”, ressaltou.
Caso de racismo
No intervalo de um mês, esse é o segundo ataque de que se tem notícia na UFSM. Recentemente, uma aula virtual sobre saúde da população negra, promovida por disciplina do curso de Nutrição da UFSM, teve de ser encerrada após um grupo impor obstáculos à continuidade da aula. A postura foi bastante semelhante à adotada pelo grupo que perturbou a defesa do estudante de Direito, após o evento ter sido interrompido, os perturbadores comemoraram.
De acordo com Rosane Leal da Silva, uma das orientadoras do Pablo Domingues e coordenadora do Núcleo de Direito Informacional e o Observatório Permanente de Discursos de Ódio, o preconceito e a discriminação não são fenômenos novos, especialmente quando praticados contra minorias, “assim denominadas em decorrência das violências a que historicamente foram expostas, tanto a violência velada, que não é facilmente perceptível, quanto aquela explícita e até mesmo brutal. Dentre os alvos constantes estão aqueles que sofrem os ataques em razão de sua raça, nacionalidade, orientação sexual, condição de saúde ou idade, opção religiosa, enfim, algum elemento que, aos olhos do ofensor, justificariam a incitação da violência. Denominamos esse comportamento de discursos de ódio, tema que há mais de uma década pesquisamos na Universidade Federal de Santa Maria”, explica.
*Com informações e imagem da Sedufsm - Seção Sindical do ANDES-SN